Não
direi que estão loucos –
porque um deus não enlouquece,
mesmo sendo verdadeiro para uns ou falso
para outros.
Mas desde que conhecemos o mundo enquanto
tal, que os seus ocupantes se habituaram
a acreditar numa divindade; divindade
essa que é a origem do tudo, do
todo e que tudo e todos influencia com
a sua sapiente decisão. Deus cria,
premeia e castiga. Sendo omnipotente,
omnipresente e omniúnico - seja
lá o que isso for -, decide por
si mesmo sem consultar terceiros ou pedir
pareceres a especialistas. É um
só, mesmo apresentando-se sob diversas
vestimentas e tendo por assessores entidades
distintas, conforme a identidade de cada
um e de cada qual. Talvez se possa distinguir
entre o deus criador e o deus religioso;
o primeiro porque criou o mundo e o segundo
porque lhe definiu as balizas de comportamento,
impondo pontos de contacto de verificação
obrigatória – “chekpoints”.
Se não foram dois, foi um que,
assim, se subdividiu!
No passado remoto, ou
antigamente há muitos anos, para
a mesma função desempenhada
por um só deus, outras civilizações
distribuíram tal esforço
por várias entidades da mesma estirpe,
onde um só deles – o pai
de todos – se sobrepunha hierarquicamente,
aos restantes. Que estavam ao mesmo nível
hierárquico. E foi assim que os
homens inventaram, Zeus, Júpiter,
Marte, Dionísio, Baco, Neptuno
e outros, cada um destinado a uma função
específica; fosse ela de deboche,
de marear, de guerrear, de beber até
fartar vilanagem ou, simplesmente, de
orientação e mentalização
de um só, sobre os outros todos.
Muitos anos mais tarde,
a comunidade de deuses tantos, deu lugar
a uma organização de deuses
poucos, cada um dedicado à sua
fé, mas sem que qualquer deles
se tivesse conseguido sobrepor aos outros
e contrariar a sua verdade.
Em nome deles, dos deuses
do Olimpo, enquanto entidade comunitária
ou do deus do Éden, Paraíso,
Céu ou como melhor se entenda,
sempre os crentes fizeram tudo o que,
por vontade própria, lhes proveu
por apetência; desde perseguir até
matar, tendo por único objectivo
a recompensa da entidade divina, mesmo
sabendo que essa não aconselhava
tais actos. À atitude destes crentes,
chamou-se fundamentalismo. Mais numas
bandas do que noutras, mais por umas fés
do que por outras, a verdade histórica
é que estes desmandos proliferam
– e infelizmente persistem –
ainda, um pouco por todo o mundo, sem
que o deus de cada um – e atente-se
no facto de que sendo ser único,
é soberano nas decisões
– mostre preocupação
maior em por fim aos actos que, aparentemente,
causam malefício na sociedade:
guerras, perseguições, fomes;
por parte de humanos contra humanos e,
por parte das forças da natureza
contra os mesmos, tempestades, terramotos,
maremotos e outros mais. Tudo isto, podendo
ser controlável pelo deus, acontece
com vontade própria; sem consulta
prévia, nem pedido de viabilidade,
nem visto de actuação.
Os deuses, parecem, deste
jeito, estar marimbando-se para quem neles
acredita e neles deposita um universo
de esperança e de fé; investindo,
cada um à sua maneira, as melhores
manifestações de fidelidade.
Quer se trate de promessas, de rezas,
de caridade, de amor ao próximo,
de dar a outra face, de dar face alguma,
de tirar dentes ou mesmo trocar olhos
por esses. Também não serve
que o deus, estando no Céu, no
Olimpo ou seja lá onde for, se
desculpe com os desvios do seu representante
na terra o qual, sendo pessoa, errare
humanu est… e enfim, está
desculpado.
Estamos, assim, abandonados:
tanto pelo deus criador como pelo deus
religioso; porque já nenhum deles
parece preocupar-se com a sua obra.
E nem sequer com as “sandálias
do pescador”!